Categoria Produção, Arte e 3D

O advento das Silicon Graphics

Graças a Deus e com mais um monte de trabalho, alguma sorte e talento, a produtora progrediu. A Intervalo começou com um PC 286 e sua Targa e nesta altura estava na Torre do Rio Sul, atendendo os maiores clientes do Brasil. Os Mac’s de então eram muito inadequados e caros para o trabalho de 3D e não existia um mercado de bons PC’s de marca. A maioria de nós que trabalhávamos com isso montávamos os PC’s com a ajuda de patriotas que traziam as peças. E o caminho não era este, na época, meados dos anos 90, o caminho do sucesso era partir para a Workstations, principalmente a rainha deste pedaço, a Silicon Graphics. Sendo assim, compramos Silicon Graphics, que era a plataforma onde todos os softwares High-End rodavam, era o degrau que dividia os profissas dos amadores.

Como eu contei no post anterior, o 3D Studio libertou os animadores de ter qualquer equipamento de vídeo, nem monitor RGB era mais necessário. Isso fez brotar uma nova leva de empresas de CGI e então as Silicon eram o sinal de que tinha “gente mais equipada”.

Indigo 2. Apesar do Impact, esta aí estava tunada para Maximum Impact. Pesava 1 tonelada

Claro que em todos os lugares os PC’s continuaram a ser usados, a diferença de preço era ENORME e a de desempenho em cálculo nem era tanto assim. Mas na hora de posar para a fotos era importante exibir as brutas. Mesmo os grandes estúdios de Hollywood, que sabíamos estar fazendo muito 3D em PC’s, na hora das entrevistas colocavam os diretores em frente das SGI’s.

Mas elas eram boas? Sim, muito boas. Eram máquinas RISC, uma tecnologia de processadores que prometia e entregava mais do que os CISC da família Intel, mas o mais importante era que a Silicon Graphics, depois SGI, acreditava que imagem é hardware. Desenvolveu um hardware incrível e dedicado para as imagens, desenvolveu o OpenGL para usar este hardware e pelo seu preço e qualidade, tinham um desempenho em imagem e estabilidade muito superior a qualquer outra coisa.

Como o preço era alto, tudo era da melhor qualidade, das memórias aos cabos, discos, parafusos.

Elas rodavam um sistema chamado IRIX, baseado no Unix e que era muito polido e competente. Uma delícia de usar (quando não dava problemas, quando virava um inferno).

Para usar elas compramos Alias Power Animator, Discreet Logic Flint, Parallax Advance e Matador. Isso era uma Powerhouse!!!! Depois falo destes softwares, este post fica como pausa para falar apenas das SGI.

Fomos muito felizes com elas, tivemos Indigos 2, Indy’s, O2’s e Octane’s. Saudades delas, mas no final nem impressionavam mais. O que era um diferencial incrível para o trabalho e marketing da produtora, viraram acumulares de pó e eméritas gastadoras de energia. Nem clientes nem funcionários as reconheciam, eram nada para eles, de modo que para desocupar espaço eu as vendi para uma empresa de tomógrafos que curiosamente usa IRIX para o controle da máquina.

A turma reunida.

Eu adorava usar elas e com a ajuda do Nekochan e de uma comunidade de Irixmaníacos, ir atualizando e integrando nos PC’s e Mac’s modernos. Mas ninguém aguentou mais.

De certo modo a filosofia da SGI venceu. Imagem é Hardware. Uma Nvidia de hoje, por exemplo, é uma SGI miniaturizada para uma placa.

Um pedacinho do Board Maximum Impact. Tudo isso hoje cabe na ponta de um alfinete.

E o que acabou com elas? Uma série de coisas. Os chips RISC, como os da família MIPS R*****, bem como os POWERPC Motorola não tiveram fôlego ($$$) para acompanhar o avanço da Intel com os seus chips de clocks altíssimos. Vendendo em muito maior quantidade, a Intel teve recursos para investir em seus CISC’s, resolver os gargalos e no final ultrapassar os RISC’s em todos os parâmetros. Lembrem que até a Apple largou os PowerPC e se jogou nos Intel. Os MIPS acabaram ficando lentos. Isso foi uma coisa.

Eu usando meu adorado Avid Media Illusion. Trabalhando em um comercial para a Leader Magazine em Full HD numa boa. De Octane.

A outra coisa, e que veio um pouco antes, foi que a Microsoft lançou um sistema operacional competente, o Windows NT, new technology. Como nunca fiz faculdade de computação, não sei se eles ensinam lá que o Windows de hoje não está em linha direta com o Windows original. O NT é um bicho todo novo, criado em cima do OS/2 IBM/Microsoft e que daí em diante os PC’s passaram a ter um desempenho aceitável em performance e estabilidade.

Para provar isso para nós, a Microsoft comprou a Softimage, um dos softwares high end da época, enriqueceu o Daniel Langlois e marcou a SGI para morrer, pois daí em diante foi possível fazer um trabalho de ponta usando Windows PC’s.

Mais devido ao preço/qualidade e tamanho das máquinas necessárias para fazer composição e edição, as Silicon Graphics continuaram ativas ainda por um tempo, mas o Alias, depois Alias Wavefront, por exemplo, nunca conseguiu se criar na Intervalo.

Eu e outro louco por SGI, meu amigo Aarão Marins e sua Tezro.

Quando ainda poderosa, a SGI juntou a Alias, Wavefront e TDI para fazer o Maya, cujo feature mais desejado, ora vejam, era rodar em Windows como o Softimage… Lançaram uns PC’s com Intel, até Itanium (quem lembrava disso), as Visual Workstations, mas aí já era, perdeu-se a guerra.

Uma pena. Não fosse a Light tão ladra e a energia tão cara, eu compraria outra só para brincar, mas não dá.

Mário Barreto

3D Studio, a Segunda Revolução

Chamo de primeira revolução o lançamento dos PC’s capazes de produzir imagens comerciais. Nem tanto o Cubicomp sobre o qual escrevi antes, eram ainda muito caros, mas com o advento das placas TARGA e o TOPAS, abriu-se a porta para que uma nova categoria de empresas e profissionais pudesse explorar. Antes era um território totalmente inóspito, de hardware e software proprietário, virtualmente inacessível.

Mas mesmo com os PC’s, ainda era um investimento considerável. Ainda mais se fosse considerado o investimento em vídeo profissional. Minha primeira U-MATIC BVU-950 SP, com board TC e TBC custou incríveis 20 mil dólares FOB, o que dava mais de 40 mil dólares se somarem os impostos, seguro, frete e demais taxas. E não era só isso, era necessário um Pulse Generator, um controlador de VT, um Patch, um Encoder, Decoder, Transcoder, Monitores RGB, cabos e instalações. Barateou demais, mas ainda era dinheiro.

Porém, o 3D Studio chegou em 1990, os PC’s já tinham placas VGA, SuperVGA High Color, algumas até Full Color, e isso libertou as pessoas de uma instalação de vídeo. Subitamente passou a ser possível trabalhar profissionalmente de qualquer PC, em casa, sem um único cabo BNC, tudo só no computador! Sem um monitor RGB separado, o que já era difícil e custoso. Hoje pode parecer estranho isso, mas isso, mais do que as qualidades do software, foram ao meu ver, o principal motivo para que o 3D Studio virasse o software de quase todos os artistas de 3D do mundo. Um domínio que está aí até hoje. Nasceu aí. O hardware de PC nesta época eram os 486.

Ele nasceu com um departamento da Autodesk, não ainda a toda poderosa de hoje, mas já uma grande empresa. Sua divisão de multimídia vinha alcançando sucesso com o Autodesk Animator, depois Animator Pro, e eles montaram uma pequena, minúscula equipe capitaneada pelo Gary Yost, para tocar esta empreitada.

Conheci o Gary em uma Siggraph, muito gente boa mas também achei ele muito maluco com a mania que tinha de mostrar o software batendo o mouse com força na mesa. Coisa de doido.

Gary Yost

Logo de cara o 3D Studio, para DOS, era muito superior em absolutamente tudo do que os seus concorrentes. Filosoficamente, estruturalmente. Suas ferramentas de modelagem e animação eram mais complexas, ele era pretensioso mesmo, colocava um poder desconhecido na mão dos animadores. Era até perigoso, porque muitas das coisas que ele prometia, e até começava a fazer, no final não acabava, hahaha.

Ele tinha uma arquitetura aberta, os IPAS plugins, ele permitia scripts, ele permitia arquivos ASCII nos modelos, era um assombro de possibilidades. E o render, apesar de simples, tinha custo benefício. Não era bom, mas não era ruim. Era “resolution independent”, vc podia fazer render em resoluções grandes para efeitos, para print… e tudo isso na sua casa.

Lógico que todo mundo que trabalhava com 3D ficou doido para ter uma cópia pirata e mesmo sem internet ainda, já existiam BBS’s e rapidamente apareceram empresas para quebrar os dongles e ele se espalhou pelo mundo. A AT&T reagiu lançando o incrivelmente ruim TOPAS VGA, mas não dava nem para o cheiro, o 3DS levantou o sarrafo.

Monorail – Intervalo – 3D de Rogério Vaz

Era bem diferente do 3D MAX, e bem constrangido pelas limitações do DOS e sua memória doida. A Intervalo imediatamente largou a produção baseada em Crystal e adotou o 3D Studio em todas as suas versões. Compramos até uma coisa que NUNCA funcionou, que foi um Render de 3D Studio para MIPS, para aproveitar o processamento das nossas Silicon Graphics para o render. Tudo ruim, o licenciamento confuso, o software confuso e o desempenho não valia a pena.

Nesta época lembro-me de que o Alexandre Sadcovitz mergulhou no software. Depois Marcelo Souza, Paulo Galvão, Rogério Vaz e muitos outros. Mesmo quando compramos o Alias|Wavefront para rodar nas SGI, o 3D Studio manteve-se como a principal ferramenta de 3D, porque era rápido, porque tínhamos muitas cópias.

Para não ficar muito grande, depois escrevo sobre o 3D MAX, que nasceu já em outras circunstâncias, e que é muito diferente do 3D Studio for DOS. o Max já nasceu na existência do Windows NT, que trouxe um mundo totalmente novo e que sacudiu o mercado de softwares de 3D.

O Gary Yost depois saiu da Autodesk e 3D Studio e foi para a Mental Images. Depois curtir o que sempre amou fazer, fotografia. Vejam em http://www.garyyost.com

Para mim o 3DS foi uma revolução e tanto. Barateou demais a instalação de um assento de animação, ao dispensar os frame buffers. Depois, de uma maneira torta, por causa da pirataria, aumentou demais a oferta de profissionais para a produtora. Antes dele, tínhamos que praticamente formar todos os colaboradores. Depois do 3DS as pessoas chegavam já sabendo trabalhar. Vejam que tudo mudou, mas até hoje o 3D MAX é o mais usado do mundo.

Mário Barreto

Quest | LABET

Nosso Cliente LABET associou-se a Quest Diagnostics e juntos criaram o maior laboratório da América Latina para a realização de Exames Toxicológicos de Larga Janela de Detecção. E também o mais moderno do mundo.

Para a ocasião da inauguração desta incrível instalação, realizamos um filme institucional de 9 minutos de duração, com entrevistas e depoimentos de seus diretores, sócios e colaboradores. Adoramos o desafio!

Quem lembra do AT&T RIO?

Como eu contei antes quando comentei sobre o True Color Paint e seu filho TIPS, eram toscos como ferramenta de arte. Era difícil criar bons degradées, era fácil fazer imagens serrilhadas. E só trabalhavam com imagens do tamanho da placa TARGA ou VISTA, o que constrangiam o tamanho ao máximo de 720×486 linhas.

O formato TGA não tem este limite e então, logo após, a AT&T Lab lançou o RIO :

“Rio graphic software is a DOS-based multimedia design product for graphic design, broadcast and video professionals. It is an object-oriented program, using vector-based drawing tools and resolution-independent technology. It employs such raster image processing features as emboss, contrast, negative, overlay, posterize, pixelize, soften and B&W.”

“RIO graphic software offers high-resolution vector-based design combined with the functionality of a paint package,” said Timothy May, product manager for AT&T’s Multimedia Software Solutions Group. “Its proxy edit feature lets customers use their favorite MS-DOS or Windows-based paint programs from within the RIO software program, and edit any resolution of supported image files.”

Vejam que a AT&T tinha este braço de tecnologia de ponta, de imagem, que depois rolou um spin off para Lucent Technologies.

Ele rodava em DOS, era Resolution Independent e Objected oriented, daí o seu nome – RIO. Requeria uma placa TARGA ou VISTA ou, lembram? MATROX. Não tinha layers, ele tinha Objetos que vc podia escalar com qualidade.

Na prática ele nos libertou do tamanho da imagem, criava grafismos vetoriais que podiam ser escalados com antialiasing, degradées de múltiplas formas, um dithering decente e muitas outras ferramentas. Com ele eu passei a poder pintar grandes imagens para usar como background, texturas mais elaboradas. Embora muitos artistas tenham feito ilustrações até para a impressão usando os primeiros RIO’s for DOS, eu o usava mais como uma ferramenta de apoio e para fazer cartelas como um Chyron. Eu gostava da qualidade dos ramps, dos caracteres, mas não gostava de usar ele. No final desa época ele ia de bundle com o Crystal Topas por 1.000,00 US$. Pouco usado, pouco amado, pouco lembrado, mas todos tinham que ter.

Depois ele evoluiu para versões com Windows e para PowerPC, Alpha, Intel e MIPS. Este mundo de computação já teve muito mais diversidade não é? Mas estas versões de Windows foram logo engolidas no mercado pelo… pelo Corel Draw!

E então, quem usou o RIO?

Abraços

Mário Barreto

QFX – A arma secreta

Vou aqui, de folião, continuar com os meus textinhos sobre a sequência de equipamentos e softwares que tenho usado em minha carreira na CGI. Tenho tido um bom feedback sobre isso, bacana.

Desta vez vou falar sobre o QFX, criado pelo texano Ron Scott em 1990. Tive o prazer de conhecer pessoalmente e conversar com ele em uma Siggraph, o cara foi super gente boa.

Conheçam-o em http://www.ronscott.com/biography.html

O QFX inicialmente era um conjunto de programas que rodavam em linhas de comando DOS, que manipulavam imagens para as placas TARGA e VISTA. TRI, TSI, Blur, Sharp, TMI… eram vários executáveis que escreviam imagens no framebuffer TARGA e as manipulavam de diversas maneiras através de flags e comandos digitáveis.

Neste ponto pude misturar o que aprendi no Cubicomp e no Script, porque fui capaz de modificar o Sequencer do Cubicomp, fazendo-o gerar arquivos .BAT no DOS com uma sequencia de operações frame a frame. Lembrem-se que ainda não tinha sido inventado um Photoshop decente, nem o mercado de edição e composição digital.

Mas nós na Intervalo já fazíamos composições complexas, somando e filtrando imagens frame a frame automaticamente controladas pelos arquivos batch em DOS. O Sequencer era capaz também de interpolar valores e setar steps de intervalos de frames. Os arquivos batch resultantes eram muito sofisticados.

Nesta época, início dos anos 90, abri com a Carla Sprinz uma produtora em SP, a Pickings, e fiz um workshop com uma galera lá. No exemplo/aula que usei para o workshop tive a oportunidade de mostrar como usar o QFX e eles ficaram loucos com isso, pois não tinham idéia de que era possível fazer composição de imagens, abrindo um novo mundo de possibilidades.

Sequencer Modificado

Mas não passei para eles o meu exclusivo Sequencer modificado. Eles dois juntos eram uma uma arma secreta e nos dava um bom diferencial. Tenho ele guardado aqui até hoje, é um talismã.

Usamos muito ele e na época pegamos um contrato com a TV Globo para fazer o resultado do TC Bamerindus. O resultado nos era passado no sábado e tínhamos que fazer o filme de animação no sábado mesmo, pois iria ao ar no domingo. O primeiro deles eu fiz usando um batch que perguntava o resultado e ficava sozinho gerando os frames ao modo do Script, e depois ainda editava sozinho na fita Betacam, também frame a frame. O processo todo levava umas 2 horas. Depois a animação mudou e o Alexandre Sadcovitz fez um programa mais sofisticado usando QuickBasic PRO, mas ainda invocando os executáveis do QFX. Também levava 2 horas, mas era mais sofisticado no gerenciamento das mídias e no tratamento de falhas.

Faustão e o TC Bamerindus

Depois disso os outros softwares foram se sofisticando, o Windows entrou em cena e o QFX foi se tornando rapidamente irrelevante e incompleto. Bom foram os primeiros, que usamos intensivamente.

Abraços e bom carnaval.

Mário Barreto